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quarta-feira, 6 de abril de 2011

Sobre platão e um piano


Ontem quando terminei de ler 'Memórias de Minhas Putas Tristes' de Gabriel García Marquéz fiquei a princípio atordoada, pois a partir do momento em que o abri pela primeira vez me tornei ansiosa de manter os meus olhos nele até que se chegasse ao final. E assim toda a informação ficou flutuando em minha cabeça, desnorteada.
Posso dizer que sofri das dores do personagem que vivia um amor platônico por uma menina do qual ele só conhecia quando embalada por seus sonhos. O fato é que quanto a menina pouco me afetou, o mais real foi compartilhar dos momentos ilusórios em que ele ia para a casa e fazia presente a figura de sua amada em todos os cantos da sua vida.
Todos já tivemos amores platônicos, diria até que a maioria de minha minhas paixões foram mais em nível mental do que em carne e osso. Mas hoje vivo uma espécie de amor que, apesar de também ser platônico, é diferente de todas as outras.
Estou apaixonada por um piano.
Minto.
Sempre fui apaixonada por um piano. Mas é que nesses últimos tempos ele se envolveu com outra pessoa e partiu meu coração. Falo de um garoto, que deve ter os mesmos tantos de anos que eu. Ele é quieto e tímido, pelo pouco que sei. Acho que deve ser porque ele gosta de falar é com música. Chamam-no de Vitinho, mas preste atenção, o sotaque é lá do Recife! E ele me deixa maluca de ciúmes porque ele toca o piano com mais amor do que qualquer outro que eu já tenha visto na minha vida. Ele não tem vergonha na cara, fecha os olhos e se enrosca nas teclas, deixando o corpo pulsar junto à música, fazendo até careta. E o piano excitado lhe responde soando as notas mais belas que tem, aquelas que ele guardou para uma ocasião especial.
A verdade é que eu jamais seria capaz de amar um piano com tamanha intensidade, dói em mim aceitar que talvez eles sejam mais felizes juntos.
Agora chegue mais perto, tenho que contar um segredo... Apesar do fato de que eu queria que o piano se entregasse a mim como fez com Vitinho, não poderei jamais negar que ele era a pessoa certa. De todas que já vi, e de todas que virão, não há de existir mais verdadeira paixão. Paixão que desenrola, sem estar presa em técnicas, métodos ou regras, paixão que conduz os dedos já habituados, ora para momentos de fúria, ora para valsas de amor.
Continuarei com o piano no pensamento. Assim como a 'Delgadina', espero que algum dia eu possa tê-lo para mim acordado, ainda está adormecido.
No final das contas, tanto eu quanto Gabriel García Marquéz sabemos o quanto é possível morrer por amor.