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quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Pseudo- Cidadania

Fazia tempo que eu não redigia um texto, mesmo porque nesses últimos tempos meus pontos de vista têm mudado; e ainda estão mudando.

Mas independente disto existe um tema do qual eu gostaria de abordar já há muito tempo. Sei que não me encontro em posição de julgar a integridade de ninguém, porém adianto que exporei meu ponto de vista de maneira bem crítica. Estamos em um país livre, não me preocupo em ser decapitada por isso; muitos já morreram por nós.

Você, eu, todos nós somos cidadãos, por teoria no mínimo. Ao menos tenho alguns números que me identificam para com o Estado. Creio que seja assim para a grande maioria. Portanto não há dúvidas, somos todos cidadãos. Mas isso me soa bizarro. Acredito que melhor definição seria algo como pseudo-cidadão ou quase-cidadão.

Está certo, nós votamos – ao menos eu – e votar nos torna pessoas politicamente ativas. Mas se não votamos pagamos multa, e ninguém quer pagar multas. Aliás, tem gente que até lucra para digitar os números mágicos na nossa super avançada e magnífica urna eletrônica (exemplo no exterior! O Brasil ta ficando high-tech!)

Creio que não se pode considerar o voto como uma definição de cidadania. Portanto reverei alguns conceitos a respeito disso, em minha ótica.

Primeiramente contextualizarei a situação da classe-média que vota no Maluf que “rouba, mas faz”.

Com uma boa formação acadêmica, e na maioria dos casos concluído o ensino superior, tem seu trabalho tranqüilo e sua casinha confortável com todos os seus bens dos quais ele tem tanto orgulho de ter. Diz-se engajado com o mundo, lê a VEJA (e agora é anti–Che), assiste o Jornal Nacional e reclama do governo no comercial da novela, quando reclama...

Instalou um sistema de segurança com câmera e cerca elétrica em sua casa e está satisfeito com sua vida comum e independente. Sequer vê o que se passa do outro lado do portão.

Fecha o seu vidro blindado e com “insulfilm” ao parar no farol (sem filosofias, ao contrário de Huck) e liga seu ar condicionado e seu rádio MP3, se isolando de toda a realidade à sua volta.

Eis o nosso digníssimo cidadão, ao menos aquele com uma capacidade intelectual suficiente para poder ser útil ao país. Repito: soa-me bizarro; muito bizarro chamar isto de cidadão.

Retrocedendo à Darwin e toda a sua teoria da evolução, o homem foi o animal que mais se destacou. Foi selecionado naturalmente, mas tão bem selecionado que hoje é a única espécie capaz de driblar a própria seleção natural. O homem com sua inteligência foi designado a administrar a natureza ao seu redor, nota-se isso desde os primórdios, quando o homem passou a domesticar animais e “plantas”. Conforme evoluímos criamos maneiras de governar mais complexas, tão complexas que a política foi se tornando seleta, de modo que aos poucos o governo distanciou-se do homem. Independente do sistema é visível que hoje a maior parte das pessoas no mundo encara o Estado como um órgão a parte, do qual não se incluem diretamente. Espera-se muito do governo, mas não se percebe que o Estado somos nós! Sem os cidadãos não existe o Estado. O governo é apenas um conjunto de órgãos e leis fundamentadas por homens visando à ordem de uma sociedade, da qual nós, pessoas comuns somos parte fundamental.

O que ocorre é que a maioria das pessoas se preocupa em ter sua vidinha, sua casinha, seu carrinho, e só. Ninguém se importa com a situação da população desfavorecida. Acham que quem deve cuidar dos problemas que não “os envolvem” é o governo, que em um domingo de sol os fez sair da sua poltrona, onde assistiam ao Faustão, para ir a uma zona (literalmente) cumprir o seu dever mínimo de “cidadãos”. Será necessário que roubem mais Rolex para que o povo tome conta da situação em que vivemos?

Melhorar o mundo é tarefa de todos. Não basta apenas votar; se estamos aqui é para fazermos algo. Nossa função mínima como pessoas politicamente ativas é fazer o uso de nosso poder. É triste pensar em todas as pessoas que vivem e que são capazes de fazer tantas coisas para o mundo, mas que simplesmente são números, documentos ambulantes...

Que se faça o mínimo, como contribuir para entidades, trabalho voluntário, plantar uma árvore. Existem tantas maneiras de se ajudar. Tantas escolas públicas que se encontram em situação deplorável. Claro que é obrigação do governo manter as instituições de ensino em boa qualidade, mas como isto não ocorre que façamos algo, doemos livros, contribuamos para o ensino desses jovens e crianças que não tem a oportunidade de uma qualidade maior de aprendizado.

Evite gastar água à toa, varra a calçada, economize no banho. Poupe energia, mande o lixo para reciclar... Opções não nos faltam. Porém que fique claro que tais atitudes não inibem os deveres do governo. O Estado deve cumprir seu papel sem desculpas. Apesar de que fica difícil com a “colaboração” do nosso Brasil Baronil, onde política é sinônimo de corrupção, estudo não passa de bolsas e cotas e projetos sociais sempre terminam em caixa 2. O certo seriam as reformas, todo mundo já sabe isso, assim como todo mundo já sabe que tais reformas são tão plausíveis quanto a dignidade de nossos excelentíssimos governantes.

(Momento bizarro. Acaba de tocar o telefone nesse instante, era a Prefeitura de Atibaia avisando que 60% da cidade já têm esgoto. Não sei o intuito dessa propaganda, na minha casa temos poço artesiano).

É fato que o governo tem faltado com os seus deveres e com as necessidades dos cidadãos. Só não acho certo ficarmos parados diante dessa situação, e aceitarmos tudo a nossa volta. O governo está completamente confortável, tendo em vista que o povo brasileiro não mais se incomoda com o panorama político atual. Nosso querido molusco tem o apoio da massa e das elites (banqueiros, altos investidores e afins), e já percebeu que ninguém se abala mais com os escândalos e falcatruas em Brasília. A classe média vive em outro mundo, um mundo paralelo, onde Deus é a Globo. E ninguém se propõe a fazer nada por ninguém.

Ninguém tem coragem de enxergar o que se passa do outro lado do portão. É fácil encarar o mundo de dentro de nossos mundos. Mas a realidade está bem distante dos jornais. E no fundo ninguém quer ver para crer.O mais fácil é se fingir de cego...